sábado, 7 de novembro de 2009

NO DIÁLOGO PARA SER

Dotado de capacidade para tornar comum o que o fascina, perturba e enaltece, o Homem descobre-se progressivamente a si mesmo nas palavras que troca. Não só, mas essencialmente. É um método que, para além de mais espontâneo, é mais directo, acessível e não requer protocolos especiais, senão os relativos às noções de respeito, amabilidade e cortesia. Tece-se uma conversa nestes parâmetros, e quem nos ouve prova a nossa competência – ou a falta dela – para transmitirmos o que temos na disposição de contar. A opinião, quando não é mais uma dúvida, formada no cérebro, nasce quando é expressa e reflecte as vivências de cada um, na comunhão dos valores socialmente instituídos. Dar crédito a quem nos diz isto ou aquilo não significa, a priori, afiançar cabalmente a seriedade das suas palavras. Mais importante é saber ouvir com o discernimento suficiente e com a proficiência habilitada que nos possibilita diferenciar o que está correcto e o que não pode ser acolhido. De outro modo, seremos máquinas de escutar, sem a capacidade de cotar a informação entrada, e aparelhos de reproduzir, na ausência de balanço expressivo. Nem tanto assim nem de outra forma, estamos profundamente convictos, porque não fomos feitos para hospedar matérias sem as assimilar a nosso contento e de forma desgraduada. Se é pela linguagem que se processa o entendimento do mundo, em combinação o jogo e o exemplo, então valorizemos as palavras interpermutadas por quem parte para o seu uso de juízo aberto e de iniciativa translúcida.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

DEIXAR PASSAR O PASSADO

Olhar o passado com probidade, quando particularmente mais desafortunado e de pouca monta nos espaços e em certo género de relações, como forma de crer ainda mais no futuro, traz consigo promissores exames e encorajadores sinais na vanguarda das nossas vontades. Sendo, o ser humano, uma espécie de arquivo animado das suas vivências, facilmente consegue inverter o curso temporal natural, recuando e avançando conforme os sentidos volitivos preferentes. E já que as memórias também coabitam em paralelo com as dos seus iguais, não pode tecer a meada da sua história de forma isolada, mas balanceada nas recordações e sonhos de todos. O que fazem certas pessoas, no seu corroer lento de vidas próximas, ao criar indícios de divórcio entre iguais, é promover a incerteza do tempo por andar. De outro modo, o modo de estar de certas pessoas resume-se a edificar castelos de imaginação errónea nas individualidades estranhas, contrariamente a quem se afirma em seriedade e correcção, sustentando a convicção de que devemos partir do crédito em nós mesmos. E sempre. Falar de saudade impossível pode não significar necessariamente acentuar o desprezo por alguém em concreto, mas olhar em frente de maneira infundida, consciente da lucidez para enfrentar novos desafios. Titubear não resolve as incertezas, se as houver, que temos. Pelo contrário, ainda as sublinha, num quadro derrotista que nos afasta da conclusão premiada que queremos dar à nossa vida. É o mesmo que partir para um qualquer concurso, ainda que de circunstância, em desprazer dominador.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

VER E SER

É muito gratificante reconhecer as excelentes qualidades que nos apontam, quando não pomos em dúvida a idoneidade da origem dessas palavras. Mais árduo é ter de admitir que haverá sempre quem nos julgue pela sua maneira de julgar: anotam aspectos menos agradáveis por lhes parecer ser possível assumir-se diferentes. Pouco certo, por eufemismo, avaliar comportamentos alheios pela individualizada leitura que fazemos do que os nossos olhos captam. Quantas ocasiões enganadora, a vista lá nos atraiçoa com aparências nadas em relances crus, suscitando equívocos e desencontros de opiniões. De má tendência, porfiar na revelação de diferentes formas de encarar a maturidade característica de uma certa teimosia de interesses. Perante a certeza dos resultados conquistados por quem teve o mérito de os obter, pode despertar a aproximação das diferenças. Isto equivale a dizer que os desafios vencidos, com maior ou menor determinação, cabem por inteiro a quem manteve viva a crença nas suas possibilidades e segurou esse repto vivo até ao fim da contenda, batalha aberta aos capazes. Portanto, uma pessoa pode não apreciar um qualquer trabalho numa perspectiva graciosa, não raro ilusória. Todavia, há também que saber que, ao sujeitarmos um trabalho à avaliação alheia, temos de esperar qualquer género de comentário, sabendo medir as distâncias entre a qualidade do seu conteúdo e as palavras ditas de cálculo. Por isso é que ninguém pode comandar os raciocínios de quem comenta uma tarefa realizada em troca de uma classificação.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

O VALOR DOS VALORES

O que une o Homem, nas profundezas do seu entendimento, senão a fé nos projectos que enceta? Avança e recua; sobe e declina, mas sempre no fito de conquistar um espaço único capaz de projectar a sua vida para lá da dos comuns. Os que assim vão tendo a noção de História são os que se entregam ao contributo nobre de dar o seu nome a causas válidas, ainda que haja sempre alguém a vaticinar fatalidades crescentes. Longe delas, como deve ser de bom tom, os bons fins não se obtêm, dada a natureza destrutiva e derrotista de quem augura a escuridão nos outros. Talvez porque pensem que a sua vida não terá fim, são de poucos auxílios e de encorajamentos nulos, espreitando marés de para ver os semelhantes derrapar em desgastes de paciência e a esgotar os dias tornados vãos, pelo vazio dos amanhãs sem nascer possível. De onde virá essa energia de repulsa, em fôlegos sôfregos encaminhados em rumo inútil? Figuras a mais e sem a noção do desperdício, em trabalhos mesquinhos de desfazer e reduzir a nada as intenções alheias, desconsiderando, a qualquer momento, as razões de quem age por princípios construtivos e sérios. Dar o valor a quem merece exige o primeiro reconhecimento de nós mesmos como seres capazes de admitir a grandeza do outro, ao invés de, por inépcia nossa, esperarmos na quietude traiçoeira por deslizes de infelicidade de quem vive sempre a apostar em si.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

A PAGA PELO SUOR

Reconhecer o esforço do trabalho encetado, cumprindo cabalmente um acordo estabelecido, é digno da maior humanidade. Sabe-se, à saciedade, que os tempos que se vivem nem sempre são propícios à satisfação plena das expectativas dos que se tem a mando. São empregadores com poucos escrúpulos e sem a noção mais ajustada da responsabilidade social da empresa que gerem, ou são intermediários ávidos de lucro fácil e adquirido logo ao virar da esquina. Quando assim acontece, a solidez do objecto conquistado esboroa-se facilmente, apenas mantendo vivo o delírio materialista efémero, porque inspirado numa desonestidade que é preciso destruir. Dever já é um acto de usura. Sabemos que a tantas horas de trabalho cabem outras tantas e contrapartida monetária. Agora, mais complicado é medir o valor do tempo oferecido graciosamente em favor dos outros. Sem aludir aos abusos que daqui possam surgir, quem dá o seu tempo em total disponibilidade, de mente aberta e coração descomprometido, reconhece não ter de esperar por um salário ou gratificação pecuniária de outra ordem, senão a consideração do gesto oferecido. É dele que necessitamos, como de pão para a boca, num cenário frio onde estamos sujeitos à circunstância arbitrária do que possa aparecer nas gentilezas da ventura, como, ainda, se fôssemos agentes passivos num mundo que reclama incessantemente pela nossa intervenção. Há lugar para todos, porquanto atentos e dispostos a refundar os princípios orientadores das relações humanas, se possível perpetuamente de acordo com uma tendência libertadora do Homem em relação ao seu espaço.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

UNIR PARA CRESCER

O diálogo favorece as trocas interpessoais de opiniões e interesses, aproximando perspectivas de maior ou menor vizinhança, consoante a mundividência própria. A atracção por uma boa conversa nasce, não raro, em momentos inusitados e desenvolve-se consoante a disponibilidade intelectual dos interlocutores. Acresce dizer que há ainda outra disponibilidade deveras importante para poder ser desconsiderada – a do tempo. Isto pressupõe admitir o abandono transitório de certas preocupações que podem interferir seriamente no intercâmbio de posições mais ou menos reflectidas. É o que se verifica nas conversas sobre a as vivências das religiões e dos respectivos papéis na explicação da procura da imortalidade, como se tudo precisasse de sentido técnico para poder estar ao alcance das nossas crenças. As religiões não são panaceias para resolver agitações nadas das querelas terrenas, nem para justificar desvios supostamente ingénuos. Auxiliam, antes, a percepção de questões deveras profundas para terem respostas instantâneas, em direcção contrária à forma de as encarar de maneira positivista. Um caso crescente nas inquietações dos homens, sempre que se vêem confrontados com a contingência de sermos contingentes, perante a inexorabilidade da vida. Poderá o nosso raciocínio alcançar uma percepção próxima capaz de percebermos a inevitabilidade do fim? Não estaremos a querer lutar contra um percurso que não cabe liminarmente à nossa vontade, exígua nos argumentos a que recorremos para tentar compreender o que de humano o transcende?

domingo, 1 de novembro de 2009

DIA DE REENCONTRO

Sem receio de estarmos próximos de qualquer embuste de linguagem, podemos afirmar que andamos na vida como que em viagem. Com a grande diferença, entre outras, que é a de não saber muito bem o itinerário nos primeiros anos. Vai-se desenhando, paulatinamente, em função do que observamos, ouvimos e aprendemos das vontades misturadas dos que connosco convivem. E cresce, em maior ou menor redundância construtiva, à medida dos nossos caprichos, anseios e virtudes, de forma sempre singular. Somos únicos, pois assim, porque ninguém se atreve a derrotar o entendimento que se tem do mundo, mesmo que se julgue inoportuno e desarticulado da realidade. Cada indivíduo é a imagem do seu próprio mundo em curso, não cabendo, por respeito solidário, a reprovação de comportamentos vistos à luz das nossas aptidões e tendências. A história constrói-nos para sermos (novos) construtores de um mundo em jornada, ajudados pelas palavras e exemplos de quem nos precedeu. Neles estão as nossas referências úteis e imprescindíveis para poder estar na vida de forma coerente e arrogada, pois assim o quiseram. Modelos vivos, como queremos ser, e novos agentes de uma humanidade em transformação, capazes de estar sempre prontos a abrir caminhos decididos e propícios à participação de quantos queiram seguir rumos certos e de amplos horizontes por descobrir. E porque a viagem não pode terminar sem que descubramos algo de verdadeiramente intenso, a única coisa a fazer que nos resta é mesmo nunca desistir de manter genuína a orientação que nos revela.